domingo, 18 de novembro de 2012

A EXPRESSÃO MUSICAL NORDESTINA


Por Josiany Dórea
                                                                                                        
Nossa Décima Sétima Conversa Afinada, abordamos sobre a música nordestina como veículo da cultura popular. Vimos que desde o período colonial, o nordeste vem se destacando com suas diversidades culturais que se alongam com a música e ritmos próprios. Percebemos que quando o Brasil passa pelo período colonial (1500-1822) deixa raízes que marcam a identidade cultural nordestina.

No período colonial a formação da sociedade é marcada pelo regime escravagista, que promove a exploração da mão-de-obra escrava africana e patriarcal, o poder estava nas mãos do chefe da família: o pai. Assim, a sociedade convive com esse modelo reproduzindo muitas consequências para o convívio social, entre eles, o machismo, preconceitos e a desvalorização do negro. A partir daí, a música transforma-se em um veículo de apelo, desabafo e movimento contra esse modelo de sociedade.

A riqueza cultural expressa nas músicas nordestinas perpassa o nordeste e invade o Brasil. As manifestações populares como, por exemplo, o folclore, as linguagens, costumes, culinárias e ritmos transformam-se com o passar dos anos, em um cenário brasileiro.

Os Ritmos: xaxado, coco, samba de roda, baião, xote, forró, Axé e frevo, dentre outros, chamam a atenção dos compositores brasileiros, poetas, escritores e vários artistas. Eles se inspiram na cultura nordestina através da arte, poesia, do cinema, divulgando nossa cultura brasileira como, por exemplo, Rachel de Queiroz, Clarice Lispector, Graciliano Ramos, Manuel Bandeira, Ariano Suassuna, Cândido Portinari e Carlos Drummond de Andrade.  
   
Desta forma pode-se notar que devemos muito aos nossos artistas nordestinos, que interpretam a dor, a seca, a escravidão e a alegria de um povo movido pela força mesmo diante das adversidades, das injustiças acometidas. Temos em destaque o baiano Jorge Amado (1912-2001) que leva nossa cultura para o mundo, o pernambucano Luiz Gonzaga (1912-1989) que trouxe do sertão o brilho do Nordeste, o cineasta baiano Glauber Rocha (1939-1981), transmite toda garra e conflitos do nordestino em seu filme: Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964). O compositor e poeta cearense Patativa do Assaré (1909-2002) que descreveu a vida simples, sofrida e esquecida do sertanejo nordestino.

Na realidade nossa Conversa Afinada representa uma homenagem e uma reflexão com algumas de tantas músicas que marcaram e marcam até hoje a historicidade de um povo que diante do sofrimento transforma a vida com muita sabedoria, vivenciada diante da dor.  

Josemar Dórea selecionou algumas canções que emocionaram a todos. Observamos que muitas canções passam despercebidas aos nossos olhos, não prestamos atenção em suas letras e o apelo que elas nos ofertam. Exemplo, à canção Marmelada composição de George Decimmus e Velato Walakiar, interpretada pela baiana Margareth Menezes relata a vinda do negro africano para o Brasil na condição de escravo:

(...) Um dia alguém me falou/ Que eu cresceria num país tão belo/ Tudo verde e amarelo/ Todo mundo sincero/Um dia alguém me falou/ Que eu cresceria num país legal/ Todo mundo igual/ Nada além do normal/Vida, que vida Será que da vida já não se apanha mais?/ Nunca mais a cegueira/ Nunca mais a besteira./ Marmelada, tô comendo nada (...) 

Ritmo e linguagem popular, a música “Marmelada” revela um Brasil que realmente existiu (?) em que todo o seu ensinamento era passado de forma conveniente e convincente pelas elites brasileiras. 
    
Outro destaque importante foi à música de Luiz Gonzaga “O ABC do Sertão”:

Lá no meu sertão pros caboclo lê/ Têm que aprender um outro ABC/ O jota é ji, o éle é lê/ O ésse é si, mas o erre tem nome de rê (...).

Percebemos nesta música toda complexidade da linguagem nordestina passada por Luiz Gonzaga. Ele retrata um povo que também possuem sua linguagem diversificada, marcada por um passado de miscigenação.

     A música do paraibano Genival Lacerda “Americanizado” é um protesto contra a desvalorização das nossas raízes. Como seguimos a cultura americana sem nem darmos conta do reflexo que nossa atitude pode percutir diante dos nossos costumes e hábitos.

Aqui tudo pirou!/ Tudo tá mudado!/ Aqui tudo pirou tudo mudou tá tudo americanizado!/Um cachorro de pano se chama Snoop/ Um ok quer dizer, tudo acertado/ Uma loja variada é shopping Center (...).

Enfim, letras e ritmos que retratam um nordeste que sofre preconceitos, descasos, dissabores diante da realidade de um povo comovido pela exclusão, com problemáticas sociais e ambientais.   
       Finalizamos com a música do paraibano Geraldo Vandré (1935) “Pra não dizer que não falei das flores”, em que aborda a esperança diante de período marcado pela ditadura militar (lançada em 1968). Classificada em segundo lugar no Festival Internacional da Canção de 1968 e, depois disso, foi proibida durante anos, pela ditadura militar brasileira. Tornou-se um hino de protestos e movimentos populares, principalmente na década de 70-80. É um grito a liberdade, resistência e igualdade humana. Vejamos um trecho da música:

Caminhando e cantando/ E seguindo a canção/ Somos todos iguais/ Braços dados ou não/ Nas escolas, nas ruas/ Campos, construções/ Caminhando e cantando/ E seguindo a canção/Vem, vamos embora/ Que esperar não é saber/ Quem sabe faz a hora/ Não espera acontecer (...).





Agradecemos a todos que participaram da nossa conversa acrescida de conhecimentos sobre a diversidade musical e cultural do  povo nordestino.