Por Josiany Dórea
Nossa Décima Sétima Conversa Afinada, abordamos
sobre a música nordestina como veículo da cultura popular. Vimos que desde o
período colonial, o nordeste vem se destacando com suas diversidades culturais
que se alongam com a música e ritmos próprios. Percebemos que quando o Brasil
passa pelo período colonial (1500-1822) deixa raízes que marcam a identidade
cultural nordestina.
No período colonial a formação da sociedade é marcada
pelo regime escravagista, que promove a exploração da mão-de-obra escrava
africana e patriarcal, o poder estava nas mãos do chefe da família: o pai.
Assim, a sociedade convive com esse modelo reproduzindo muitas consequências
para o convívio social, entre eles, o machismo, preconceitos e a desvalorização
do negro. A partir daí, a música transforma-se em um veículo de apelo, desabafo
e movimento contra esse modelo de sociedade.
A riqueza cultural expressa nas músicas nordestinas
perpassa o nordeste e invade o Brasil. As manifestações populares como, por
exemplo, o folclore, as linguagens, costumes, culinárias e ritmos
transformam-se com o passar dos anos, em um cenário brasileiro.
Os Ritmos: xaxado, coco, samba de roda, baião, xote,
forró, Axé e frevo, dentre outros, chamam a atenção dos compositores
brasileiros, poetas, escritores e vários artistas. Eles se inspiram na cultura
nordestina através da arte, poesia, do cinema, divulgando nossa cultura
brasileira como, por exemplo, Rachel de Queiroz, Clarice Lispector, Graciliano
Ramos, Manuel Bandeira, Ariano Suassuna, Cândido Portinari e Carlos Drummond de
Andrade.
Desta forma pode-se notar que devemos muito aos nossos
artistas nordestinos, que interpretam a dor, a seca, a escravidão e a alegria
de um povo movido pela força mesmo diante das adversidades, das injustiças
acometidas. Temos em destaque o baiano Jorge Amado (1912-2001) que leva nossa
cultura para o mundo, o pernambucano Luiz Gonzaga (1912-1989) que trouxe do sertão o brilho do Nordeste, o cineasta
baiano Glauber Rocha (1939-1981), transmite toda garra e conflitos do
nordestino em seu filme: Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964). O compositor e
poeta cearense Patativa do Assaré (1909-2002) que descreveu a vida simples,
sofrida e esquecida do sertanejo nordestino.
Na realidade nossa Conversa Afinada representa
uma homenagem e uma reflexão com algumas de tantas músicas que marcaram e
marcam até hoje a historicidade de um povo que diante do sofrimento transforma
a vida com muita sabedoria, vivenciada diante da dor.
Josemar Dórea selecionou algumas canções que
emocionaram a todos. Observamos que muitas canções passam despercebidas aos
nossos olhos, não prestamos atenção em suas letras e o apelo que elas nos
ofertam. Exemplo, à canção Marmelada composição de George Decimmus e Velato
Walakiar, interpretada pela baiana Margareth Menezes relata a vinda do negro
africano para o Brasil na condição de escravo:
(...)
Um dia alguém me falou/ Que eu cresceria num país tão belo/ Tudo verde e
amarelo/ Todo mundo sincero/Um dia alguém me falou/ Que eu cresceria num país
legal/ Todo mundo igual/ Nada além do normal/Vida, que vida Será que da vida já
não se apanha mais?/ Nunca mais a cegueira/ Nunca mais a besteira./ Marmelada, tô comendo
nada (...)
Ritmo e linguagem popular, a música
“Marmelada” revela um Brasil que realmente existiu (?) em que todo o seu
ensinamento era passado de forma conveniente e convincente pelas elites
brasileiras.
Outro destaque importante foi à música de Luiz Gonzaga “O
ABC do Sertão”:
Lá no meu sertão pros
caboclo lê/ Têm que aprender um outro ABC/ O jota é ji, o éle é lê/ O ésse é
si, mas o erre tem nome de rê (...).
Percebemos nesta música toda complexidade da linguagem
nordestina passada por Luiz Gonzaga. Ele retrata um povo que também possuem sua
linguagem diversificada, marcada por um passado de miscigenação.
A
música do paraibano Genival Lacerda “Americanizado” é um protesto contra a
desvalorização das nossas raízes. Como seguimos a cultura americana sem nem
darmos conta do reflexo que nossa atitude pode percutir diante dos nossos costumes
e hábitos.
Aqui tudo pirou!/
Tudo tá mudado!/ Aqui tudo pirou tudo mudou tá tudo americanizado!/Um cachorro
de pano se chama Snoop/ Um ok quer dizer, tudo acertado/ Uma loja variada é
shopping Center (...).
Enfim, letras e ritmos que retratam um nordeste que sofre
preconceitos, descasos, dissabores diante da realidade de um povo comovido pela
exclusão, com problemáticas sociais e ambientais.
Finalizamos
com a música do paraibano Geraldo Vandré (1935) “Pra não dizer que não falei
das flores”, em que aborda a esperança diante de período marcado pela ditadura
militar (lançada em 1968). Classificada em
segundo lugar no Festival Internacional da Canção de 1968 e, depois disso, foi
proibida durante anos, pela ditadura militar brasileira. Tornou-se um hino de
protestos e movimentos populares, principalmente na década de 70-80. É um grito
a liberdade, resistência e igualdade humana. Vejamos um trecho da música:
Caminhando e cantando/ E seguindo a
canção/ Somos todos iguais/ Braços dados ou não/ Nas escolas, nas ruas/ Campos,
construções/ Caminhando e cantando/ E seguindo a canção/Vem, vamos embora/ Que
esperar não é saber/ Quem sabe faz a hora/ Não espera acontecer (...).
Agradecemos a todos que participaram da nossa conversa
acrescida de conhecimentos sobre a diversidade musical e cultural do povo nordestino.
Show de bola.
ResponderExcluirValeu, Márcio!
ExcluirCom referência a Décima Sétima Conversa Afinada sobre a Expressão Musical Nordestina, apesar do tema ter sido improvisado, foi muito bom e nos enriqueceu de informações como por exemplo, o chefe de família, aquele homem machão dominador, a exploração dos negros (escravos), a cultura e o sofrimento do povo nordestino. As músicas que foram citadas, as quais muitas vezes não damos atenção nas letras que falam da dor daqueles povos, da seca e das injustiças que sofriam, e por que não dizer que ainda hoje sofrem.
ResponderExcluirParabéns Any e Josemar, vocês foram brilhantes na apresentação deste tema. Eu imagino como teria sido se não fosse improvisado!...
Luzia Cordeiro
Obrigada Luzia. Realmente é um tema bastante enriquecedor.
ResponderExcluirValeu. Sua participação também foi muito importante para todos nós.
Abraços,
Any.