domingo, 3 de janeiro de 2016

OLHAR, VER E PENSAR
Josiany Dórea


O artigo abaixo nos remete a uma reflexão filosófica sobre o ver e o olhar aprendendo a pensar sobre a diferença entre ambos. A filósofa Márcia Tiburi nos proporciona um novo olhar acerca do ver ... A importância de buscarmos o olhar crítico, reflexivo para as artes, e acredito, para nossa vida cotidiana, nos dará uma nova proporção para o pensar.


Vamos olhar vendo e pensando nas variadas possibilidades...







APRENDER A PENSAR É DESCOBRIR O OLHAR

Márcia Tiburi




A diferença entre ver e olhar é tanto uma distinção semântica que se torna importante em nossos sofisticados jogos de linguagem tomados da tarefa de compreender a condição humana – e, nela, especialmente as artes –, quanto um lugar comum de nossa experiência. Basta pensar um pouco e a diferença das palavras, uma diferença de significantes, pode revelar uma diferença em nossos gestos, ações e comportamentos. Nossa cultura visual é vasta e rica, entretanto, estamos submetidos a um mundo de imagens que muitas vezes não entendemos e, por isso, podemos dizer que vemos e não vemos, olhamos e não olhamos. O tema ver-olhar – antigo como a filosofia e a arte – torna- se cada vez mais fundamental no mundo das artes e estas o território por excelência de seu exercício. Mas se as artes nos ensinam a ver – olhar, é porque nos possibilitam camuflagens e ocultamentos. Só podemos ver quando aprendemos que algo não está à mostra e podemos sabê-lo. Portanto, para ver olhar, é preciso pensar.
Ver está implicado ao sentido físico da visão. Costumamos, todavia, usar a expressão olhar para afirmar uma outra complexidade do ver. Quando chamo alguém para olhar algo espero dele uma atenção estética, demorada e contemplativa, enquanto ao esperar que alguém veja algo, a expectativa se dirige à visualização, ainda que curiosa, sem que se espere dele o aspecto contemplativo. Ver é reto, olhar é sinuoso. Ver é sintético, olhar é analítico. Ver é imediato, olhar é mediado. A imediaticidade do ver torna-o um evento objetivo. Vê-se um fantasma, mas não se olha um fantasma. Vemos televisão, enquanto olhamos uma paisagem, uma pintura.

A lentidão é do olhar, a rapidez é própria ao ver. O olhar é feito de mediações próprias à temporalidade. Ele sempre se dá no tempo, mesmo que nos remeta a um além do tempo. Ver, todavia, não nos dá a medida de nenhuma temporalidade, tal o modo instantâneo com que o realizamos. Ver não nos faz pensar, ver nos choca ou nem sequer nos atinge. As mediações do olhar, por sua vez, colocam-no no registro do corpo: no olhar – ao olhar - vejo algo, mas já vitimado por tudo o que atrapalha minha atenção retirando-a da espécie sintética do ver e registrando- a num gesto analítico que me faz passear por entre estilhaços e fragmentos a compor – em algum momento – um todo. O olhar mostra que não é fácil ver e que é preciso ver, ainda que pareça impossível, pois no olhar o objeto visto aparece em seus estilhaços de ser e só com muito custo é que se recupera para ele a síntese que nos possibilita reconstruir o objeto. É como se depois de ver fosse necessário olhar, para então, novamente ver. Há, assim, uma dinâmica, um movimento - podemos dizer - um ritmo em um processo de olhar-ver. Ver e olhar se complementam, são dois movimentos do mesmo gesto que envolve sensibilidade e atenção.

O olhar diz-nos que não temos o objeto e, todavia, nos dispõe no esforço de reconstituí-lo. O olhar nos faz perder o objeto que visto parecia capturado. Para que reconstituí-lo? Para realmente capturá-lo. Mas essa captura que se dá no olhar é dialética: perder e reencontrar são os momentos tensos no jogo da visão. Há, entretanto, ainda outro motivo para buscar reconstruir o objeto do olhar: para não perder além do objeto, eu mesmo, que nasço, como sujeito, do objeto que contemplo – construo enquanto contemplo. Olhar é também uma questão de sobrevivência. Ver, por sua vez, nos liberta de saber e pode nos libertar de ser. Se o olhar precisa do pensamento e ver abdica dele, podemos dizer que o sujeito que olha existe, enquanto que o sujeito que vê, não necessariamente existe. Penso, logo existo: olho, logo existo. Eis uma formulação para nosso problema.
Mas se não existo pelo ver, não estou implicado por ele nem à vida, nem à morte. Ver nos distancia da morte, olhar nos relaciona a ela. O saber que advém do olhar é sempre uma informação sobre a morte. A morte é a imagem. A imagem é, antes, a morte. Ver não me diz nada sobre a morte, é apenas um primeiro momento. Ver é um nascimento, é primeiro. O olhar é a ruminação do ver: sua experiência alongada no tempo e no espaço e que, por isso, nos instaura em outra consistência de ser. Por isso, nossa cultura hiper visual dirige-se ao avanço das tecnologias do ver, mas não do olhar. É natural que venhamos a desenvolver uma relação de mercadoria com os objetos visualizáveis e visíveis. O olhar implica, de sua parte, o invisível do objeto: a coisa. Ele nos lança na experiência metafísica. Desarvoramos a perspectiva, perturba-nos. Por isso o evitamos. Todavia, ainda que a mediação implicada no olhar faça dele um acontecimento esparso, pois o olhar exige que se passeie na imagem e esse passear na imagem traça a correspondência ao que não é visto, é o olhar que nos devolve ao objeto – mas não nos devolve o objeto - não sem antes dar-nos sua presença angustiada.

O olhar está, em se tratando do uso filosófico do conceito, ligado à contemplação, termo que usamos para traduzir a expressão Theorein, o ato do pensamento de teor contemplativo, ou seja, o pensar que se dá no gesto primeiro da atenção às coisas até a visão das ideias tal como se vê na filosofia platônica.

Paul Valéry disse que uma obra de arte deveria nos ensinar que não vimos aquilo que vemos. Que ver é não ver. Dirá Lacan: ver é perder. Perder algo do objeto, algo do que contemplamos, por que jamais podemos contemplar o todo. O que se mostra só se mostra por que não o vemos. Neste processo está implicado o que podemos chamar o silêncio da visão: abrimo-nos à experiência do olhar no momento em que o objeto nos impede de ver. Uma obra de arte não nos deixa ver. Ela nos faz pensar. Então, olhamos para ela e vemos.



Artigo originalmente publicado pelo Jornal do Margs, edição 10 (setembro/outubro)/ www.arteescola.org.br.                       

sábado, 5 de dezembro de 2015


Racismo, discriminação e drogas...

Josiany Dórea
Em tempos de muitos comentários e polêmicas sobre racismo, preconceitos e discriminação racial, acredito que seja interessante ouvir outras vozes. Assim, podemos analisar e/ou discutir os problemas sociais brasileiros com um novo olhar. Será que Carl Hart está com a razão? Vejamos...

"Brasil vive apartheid e culpam as drogas", diz Carl Hart

Ascom - Secretaria da Justiça do Estado / Divulgação
Primeiro neurocientista negro a se tornar professor titular da universidade de Columbia, em Nova York (EUA), autor do livro Um Preço Muito Alto: Jornada de um neurocientista que desafia nossa visão sobre as drogas, o pesquisador norte-americano Carl Hart. 

Na segunda passagem pela capital baiana, Hart fala sobre o trabalho que vem desenvolvendo em relação à política mundial antidrogas (na visão dele "uma política enganadora").

1- Quais são suas principais ideias sobre a política de drogas no mundo?
(Carl) É uma pergunta ampla. Escrevi um livro inteiro sobre isso. As políticas de drogas são diferentes a depender de onde se está. No Brasil, o principal problema é que as pessoas estão sendo induzidas ao erro, enganadas, em relação às drogas na sociedade. Dizem à população que as drogas são um problema em si, quando as questões estão ligadas à própria estrutura social, discriminação racial, pobreza, falta de educação, falta de inclusão em certos grupos. O que há, essencialmente, é um apartheid. E culpam as drogas, por meio de campanhas contra o crack, como se o crack fosse o problema. O crack apareceu no Brasil por volta de 2005, a pobreza está desde sempre, assim como a violência e o crime. Atribuir essas questões à existência das drogas e dos traficantes é desonesto. Sugiro às pessoas, principalmente aquelas que estão sendo colocadas nas cadeias ou mortas pela polícia, que se levantem e digam: "Essa política antidrogas é besteira!".

2- A respeito da defesa do sr. da legalização ou descriminalização das drogas nos EUA, o mesmo pode ser aplicado no Brasil?
(Carl) Claro. Seja legalização ou descriminalização, o que quer que funcione na sociedade seria bom. Devemos perguntar quais questões queremos resolver: Se estamos preocupados com traficantes, teremos que pensar sobre a legalização, pois tem a ver com o comércio. Por outro lado, traficantes não terão êxito se houver inclusão social. Até descobrimos como sermos mais inclusivos, sempre teremos problemas com o tráfico. Onde houver drogas e pessoas terá tráfico. Mas, enquanto pessoas não forem incluídas, haverá economia clandestina.
3- O sr. crê que o uso de drogas passa por um problema de saúde em vez de polícia?
(Carl)  Depende muito. Para a maioria das pessoas que usa drogas não se trata de um problema de saúde, embora possa se tornar. Pense, por exemplo, no uso do automóvel. Muita gente dirige de forma imprudente e acaba tendo problemas, se envolve em acidentes, o que acaba se tornando um problema de saúde. Mas a maioria da população usa o automóvel de maneira segura e tal uso não se configura um problema de saúde pública.
4- Esse talvez seria um dos motivos pelos quais as pessoas enveredam pelo tráfico?
(Carl)  As pessoas sempre perseguem as necessidades básicas, não importa em qual sistema vivam. Elas precisam comer, morar, precisam do mínimo de respeito. Quando não se tem isso, elas vão buscar em outro lugar. De repente, vem alguém que oferece um 'trabalho' no tráfico ou qualquer outra atividade, e essa pessoa simplesmente pega.
5- Temos um dilema na Bahia: a maioria dos policiais é negra e educada para combater uma população predominantemente negra. Qual a percepção do sr. sobre essa realidade?
(Carl) Essa pergunta tem uns componentes notáveis. A primeira coisa é que toda pessoa, de qualquer raça, tende a ser morta por um semelhante dela. Por todo o mundo, não é incomum. Quando falamos de negros, achamos que seria incomum, mas não é. Segundo, quando pensamos na polícia, é uma organização que simplesmente faz o que a estrutura de poder quer que ela faça. E a estrutura de poder, nesse caso, é branca. Não é como se a polícia daqui se comportasse de forma anormal. Eles sabem a quem obedecem. É simples. Por isso que estou tentando enfatizar que é um problema não haver lideranças negras aqui. Por que, se houvesse, realmente poderia se traçar um panorama sobre quais são os problemas da violência, de fato. Não é uma garantia de que teríamos um entendimento por completo, até por que nos Estados Unidos temos lideranças negras em inúmeros locais, mas eles são igualmente ignorantes. Eles não entendem o que está acontecendo, enquanto outros são conscientes. Dessa maneira, o fato de haver lideranças negras não é garantia de que tenham uma leitura do contexto. Mas, certamente, essa presença aumenta as possibilidades de compreensão desse quadro.
6-Para sustentar a proibição, políticos no Brasil defendem que o sistema público de saúde não suportaria uma possível legalização...
(Carl)  Provavelmente, é algo estúpido e errado. Eu realmente não ouço políticos, não são pessoas que devem ser ouvidas nesse assunto, mas pessoas que têm publicações nessa área, que têm evidências, informação. Políticos, geralmente, são idiotas e, nem penso neles.
7-Salvador é a cidade com a maior população negra fora da África. Ainda assim, nunca tivemos um prefeito negro. Como o sr. vê isso?
(Carl)  É algo vergonhoso. Percebo que há muito poucos negros em posições de liderança. Por conta disso, penso que os negros daqui deveriam protestar. Deveriam ser educados para dizer: 'Isso é inaceitável!" Até que as pessoas tenham consciência disso tudo vai continuar na mesma. Enquanto houver essa falta de inclusão, toda a conta vai ser creditada às drogas. Há um apartheid silencioso acontecendo aqui.
8- O sr. acredita que o Brasil, assim como ocorreu com Obama nos Estados Unidos, um dia terá um presidente negro?
(Carl) Eu não sei se esse deva ser o objetivo primordial do Brasil, por agora. Não faço ideia. Até porque, se você me perguntasse se eu imaginaria que um dia haveria um presidente negro nos Estados Unidos, eu diria não. No final, estaria errado. Não sou muito bom nessas especulações. Penso que a população brasileira deveria se focar mais na igualdade, na inclusão dos cidadãos no mainstream (posição de destaque). Assegurar que deve haver mais negros com educação, moradia, empregos, na classe média. Penso que esse deva ser o foco.
(Entrevista exclusiva concedida ao site A TARDE)


quinta-feira, 26 de novembro de 2015


Racismo
 Porque é tão difícil entendermos que somos iguais?

Josiany Dórea
Rasgue a exclusão
Rasgue a discriminação
Rasgue o racismo
Rasgue o preconceito
Temos o direito de ser iguais quando a diferença nos inferioriza
Temos o direito de ser diferentes quando a igualdade nos descaracteriza
Heduardo Kiesse

Vejamos um texto reflexivo que nos remete sentimentos de revolta e indignação por ainda estarmos caminhando em passos lentos, porém, largos. Contudo, sabemos que é possível mudar a partir de uma consciência coletiva com atitudes nobres e educativas para as novas gerações. Vamos acreditar!!!
Esse é meu Grove!”, disse Deise Sousa, percussionista, às vezes poeta, feminista negra militante, assistente social, técnica do projeto Ponto de Cidadania e mestranda no Programa de Pós-Graduação em Estudos Interdisciplinares sobre Mulheres, Gênero e Feminismo (PPGNEIM) da Universidade Federal da Bahia.
                                  LIBERDADE É LUTAR
Imagem: Zumbi 
- Obra da artista plástica brasileira 
Zulmira Gomes
Falar do dia 20 de novembro, enquanto mulher negra, feminista e militante, é mais um dia de reflexão, é mais um dia para demarcamos os nossos passos na direção do construto de luta contra a discriminação racial nas relações sociais que implicam nas assimetrias de gênero em busca da minha/nossa liberdade. Movida por um sentimento de justiça e indignação, meu lugar de fala é como militante e assistente social que atua na garantia dos Direitos Humanos para População em Situação de Rua.
Nessas circunstâncias, por “sermos diferentes”, que a minha memória insiste em ver as lágrimas vermelhas derramando sobre a pele escura. É um sentimento que reverbera dor, toda vez que puxo a respiração e sinto que sou atravessada pelo racismo, contaminado de machismo, misoginia e sexismo. Esse conjunto de opressões impulsionou as mulheres de minha família e outras mulheres negras a ocuparem espaços de subalternidade.
O racismo, acompanhado do estado heteropatriacal, indissociável de suas faces perversas, opera com ações simbólicas e materiais carregadas com as intersecções que objetivamente alimentam as matizes opressoras com efeito devastador em nossas vidas. No pensamento de Audre Lorde, ela enfatiza que “É aprender a tomar nossas diferenças e torná-las forças, pois as ferramentas do senhor nunca vão desmantelar a casa-grande”.
A chaga aberta do racismo, se arvora em proferir ideologia de uma sociedade racista e fascista que constrói de maneira estratégica a perpetuação e reprodução do mito da igualdade racial. Assim, quando olho para dentro de mim e para meus pares, vejo homens e mulheres cotidianamente na labuta da sobrevivência. Decerto, corroboro com Jurema Werneck, que afirma: “NOSSOS PASSOS VÊM DE LONGE”. 
Portanto, ainda que o capitalismo patriarcal queira nos conduzir à margem da sociedade, nós resistimos; em especial, nós, mulheres negras, que quebramos paradigmas. Aqui, trago um exemplo de minha vida que certamente converge com outras histórias, em que apenas a terceira geração de mulheres de minha família conseguiu adentrar nas universidades. Ainda que, “nesse lugar” de luta, não estejamos livres de experimentar o sabor amargo do racismo, bem como não nos furtamos em esquecer a cena que revisita a minha/nossa memória por me ver e me identificar com a tragédia vivenciada por Cláudia Silva Ferreira, arrastada por uma viatura da Polícia Militar do Rio de Janeiro até a morte, ali é o meu sexo, meus lábios grossos, é o meu cabelo crespo, minhas idades, é naquele corpo que sustenta a minha classe, minha raça, minha história.
Precisamos resistir e criar estratégias de superação e combate ao racismo para que nossas crianças negras, oriundas da periferia, não experimentem vivências vexatórias como eu experimentei na minha infância, como mostra a letra da música “Nega do cabelo duro”, exemplos que tendem a produzir e reproduzir modelos na contramão da construção da autoestima, do protagonismo e do empoderamento delas.
            Resistimos, mesmo quando os nossos jovens são violentados pelo braço armado do Estado, justificando a sua ação racista na política de combate às drogas balizando um terreno fértil para ceifar a vida de nossa juventude negra e pobre. O saudoso Gey Espinheira pontuava essa ação como “negrocídio”.
Na semana do dia 20 de novembro, a tristeza toma meu peito com a perda de mais um guerreiro que o sistema projetou para as práticas transgressoras, homem negro, de uma sensibilidade e inteligência destacada, mas a sociedade excludente lhe deu régua e compasso, pois não basta ser pobre, faz-se necessário criminalizar a pobreza. Foi uma morte individual e concomitante coletiva, pois ramifica para outros espaços que simbolicamente afetam a saúde mental comunitária e, em especial, a familiar.
É mais uma mãe negra que chora pela perda de seu filho, é mais um filho que cresce sem a presença afetiva de um pai, é mais uma mulher negra sozinha que irá trabalhar potencialmente mais para prover a subsistência de sua família.
Com toda conjuntura negativa do contexto histórico do racismo ainda perpetrado no Brasil, nós resistimos engajadas/os com a luta do movimento negro, que culminou em diversas ações de políticas afirmativas, criação de leis e secretárias nas três esferas governamentais, atualmente avançamos com a ONU, proclamando a década internacional afrodescendente, que institui de 1º de janeiro de 2015 a 31 de dezembro de 2024 o tema: “Reconhecimento, Justiça e Desenvolvimento”, objetivando promover o respeito, a proteção e a garantia de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais dos afrodescendentes".
A Bahia foi o primeiro estado a aderir à proposta da SEPPIR. Assim, é importante celebrar as conquistas, mas não esqueçamos de apontar os desafios em reparar séculos de exclusão, opressão e exploração, contudo, estamos avançando com incansáveis passos largos para superação da desigualdade racial, intolerância religiosa e xenofobia que acomete a nossa população negra. 
Há um paradoxo nessa caminhada, estejamos atentos e atentas às máscaras da conjuntura política, econômica e neoliberal do Estado, porque ele tem cor e é macho. 
Precisamos combater o patriarcado e seus privilégios que usufruem de instrumentos materiais e ideológicos para manter-se no “berço esplêndido”. Será que nesse lugar não cabem as nossas diferenças ou alguma coisa está dentro da ordem para permanecer as desigualdades? Assim, sigamos com a Nação Zumbi: “Um homem/mulher roubado/a nunca se engana”.
As nossas lentes de gênero, classe e raça precisam estar afiadas, pois é lutando que mandamos o racismo embora. Que sejamos as mãos, os pés, os pensamentos e a voz para efetivar a justiça e igualdade de direitos. Que a nossa história esteja firme e segura em nossas mãos. Finalizo este ensaio com o pensamento negro de Nina Simone: “Liberdade para mim é isto: Não ter medo”.


segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

Formar cidadãos consumidores com consciência crítica e princípios éticos.
Será possível?
                                                                                                                                     

Josiany Dórea


Como podemos conscientizar os jovens sobre o consumismo exacerbado? Qual o papel da Escola? A escola pode ajudar? E qual o caminho para um consumismo saudável, sem exageros? São questões que estimulam nossa reflexão.

Acreditamos que a escola é o instrumento mais adaptável para a conscientização dos jovens consumidores em formação.

Vejamos um texto da professora mineira, Terezinha Rios que nos remete a refletir sobre a difícil arte de consumir com consciência crítica, em nossa contemporaneidade.   

                                                   Consumir é viver?
A escola precisa formar cidadãos conscientes que sejam capazes de construir uma sociedade crítica.

Construir a vida boa - essa é a finalidade de uma ação que se fundamenta nos princípios éticos. Na perspectiva da moral, temos muitos critérios e referências para qualificar como boa a vida das pessoas. Há os que julgam que ela é fruto do poder que se exerce sobre os outros. Há também quem a associe à posse de bens e à satisfação de desejos, quaisquer que sejam eles - situações que, na sociedade contemporânea, estão estreitamente ligadas ao consumo. A posse de coisas, de dinheiro e até de pessoas tem sido algo bastante estimulado, revelando valores nem sempre fundamentados em princípios sólidos. Os indivíduos se mobilizam para adquirir aquilo que lhes dê prestígio, o destaque dos demais e os faça ocupar lugares privilegiados no cenário social. Poder comprar é importante, mas poder comprar o que não está alcance de outros é apresentado como garantia de felicidade. A vida boa, feliz, tem sido frequentemente identificada como aquela em que se pode consumir. A imagem do cidadão confunde-se, então, com a do consumidor.
É importante pensar no papel que a instituição de ensino desempenha nesse contexto e na responsabilidade dos gestores em relação ao que se vivencia no cotidiano educacional. É preciso indagar, criticamente, se a escola - que se propõe a formar cidadãos - não tem contribuído para o desenvolvimento do espírito consumista, assim como que riscos ela corre ao se deixar levar pelos apelos feitos pela mídia, pelos veículos de publicidade e até mesmo pelas famílias.
No livro A Ética É Possível num Mundo de Consumidores? cuja leitura recomendo, o pensador polonês Zygmunt Bauman nos alerta em relação a cenários preocupantes no que diz respeito a essa questão. Ele faz referência à Educação como algo que pode contribuir para uma resposta afirmativa à pergunta-título da obra. O processo de ensino e de aprendizado é um movimento de construção da humanidade, de criação e recriação de cultura. Esta, fruto do trabalho, tem como objetivo satisfazer as necessidades humanas. Contudo, ao elaborar os produtos culturais, os indivíduos não atendem apenas às necessidades básicas, mas inventam novos itens indispensáveis. Isso faz parte do que nos constitui como pessoas, porém, a maneira como as necessidades são exploradas em cada contexto social pode ser problemática. É a esse assunto que nos referimos quando falamos em um mundo de consumidores. Em vez do alimento, há um apelo para que busquemos determinados produtos e marcas. Mais que lazer, procuramos aquilo que nos é apresentado como o que faz sucesso.
"Consumir é viver, conviver é sumir", canta Paulinho da Viola em um de seus sambas, no qual traz uma crítica aguda à vida transformada em supermercado, em shopping center. A escola tem de ter claro que conviver é a palavra de ordem não para sumir, mas para aparecer, no espaço político, como participante da construção da sociedade. Daí ser indispensável um projeto de conscientização e de diálogo frequente em relação aos valores que sustentam o trabalho. Se a resposta que dermos a Bauman for negativa, teremos perdido a esperança, que não se compra - é algo que se sente e se partilha. A escola necessita recorrer à ética e criar espaço para que possamos "esperançar".


 
Publicado em GESTAO ESCOLAR, Edição 019.





Terezinha Rios é graduada em Filosofia e doutora em Educação.







sexta-feira, 2 de agosto de 2013

Visitação ao Palácio Rio Branco

                                                                        Por Josiany Dórea

 
A nossa conversa afinada realizou-se no Palácio Rio Branco. Retornamos aos nossos encontros em grande estilo fazendo uma releitura sobre a nossa história
                                                                                                     

O Palácio do Rio Branco era a residência e sede do Primeiro Governador Geral do Brasil, Tomé de Souza. Está localizado na Praça Tomé de Souza, ao lado do Elevador Lacerda; próximo a Prefeitura de Salvador e a Câmara dos Vereadores. 
   


       Segundo os historiadores, o Palácio do Rio Branco representa a quarta versão arquitetônica do Palácio Real dos Governadores feito pelo fundador da cidade, Tomé de Souza. Considerado o centro político da Cidade, o palácio transformou-se em cenário de fatos históricos acompanhados de várias celebridades da época. Em 1818, o Palácio hospedava D. João VI e sua esposa Dona Carlota Joaquina e vários netos, entre os quais D. Pedro, menino de nove anos, depois Imperador do Brasil. Em 1859 foi residência provisória de D. Pedro II e sua mulher, a imperatriz Tereza Cristina. 

          Em 24 de fevereiro de 1900 é inaugurada a construção do novo prédio do palácio, com vários salões e salas, na gestão do governador da Bahia, Luís Viana. 

         O Palácio foi um dos pontos atingidos pelo bombardeio efetuado na cidade do Salvador, a mando do Presidente da República Hermes da Fonseca, em 1912. O prédio ficou praticamente em ruínas. Entre as várias perdas, a mais prejudicial foi à destruição do rico acervo de livros raros que ficava no térreo. Contudo, em 1919, é edificada a última construção que passa a ser chamada de Palácio do Rio Branco, em homenagem ao Barão do Rio Branco. Toda a reconstrução da parte bombardeada e demolida na fachada principal foi projetada pelo arquiteto italiano Júlio Conti.  

    No ano de 1949, o palácio passa por novas reformas e ampliações em função de crescimento administrativo, permanecendo como centro de decisões até 1979.


Parte externa do Palácio do Rio Branco
Atualmente o Palácio Rio Branco abriga a Fundação Pedro Calmon, a Fundação Cultural do Estado da Bahia e o Memorial dos Governadores. Em 2010, novamente restaurado, o Palácio passa a receber visitantes   com   hora    marcada   e acompanhada por guias. “O Rio Branco  tem fachada eclética, refinado interior em estilo do período belle époque e está construído a 70 metros de altura do nível do mar, acima da Baía de Todos os Santos, no mesmo local em que Tomé de Souza edificou, a partir de 1549, a primeira casa governamental do Brasil e, por isso, esse prédio é tão emblemático para ser mais visitado e conhecido”, explica o diretor geral do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural, Frederico Mendonça.

Observamos que somos capazes de vislumbrar o mar, curtimos as praias, bares e restaurantes, show com variados estilos musicais, contudo, não utilizamos um tempo para contemplar nossos museus. É preciso que os órgãos públicos e os canais midiáticos divulguem e incentivem a participação da sociedade aos museus, principalmente em Salvador.
Visto que, em nossa cultura, relacionamos as visitas aos museus com aulas de campo nas Escolas. Então, fica  uma representação de que o museu é para estudos acadêmicos. Geralmente, não conseguimos associar o Museu como uma boa dica para nosso lazer  nos fins de semana.

 

O museu é, portanto, o instrumento  que garante a reprodução da  nossa  história, pois, transforma as personagens, objetos, livros e afins em imortais; o que possibilita reviver o contexto histórico  e  cultural  de uma nação. Observamos isso no Palácio Rio Branco em que comporta os acervos da nossa história política baiana.
                                                                                    

Visitamos o Palácio Rio Branco com hora marcada   e   acompanhados  pela    guia Itamara que nos proporcionou  uma   manhã   de conhecimentos  e  recordações  à  nossa história. Ela nos informou que atualmente o governador Jacques Wagner trabalha em   umas  das  salas  do Palácio, resgatando a nossa história.
Passamos pela a escada de cristal   com   seu tapete vermelho, a sala de espelhos, sala de despachos; a estátua  do  Governador Tomé de Souza e contemplamos  a  linda vista para a baia de Todos os Santos.


Atual sala de despachos 
do Governador Jacques Wagner

Visitamos   também   o   Memorial   e   a  Galeria dos Governadores Republicanos Baianos, localizado no Térreo do  Palácio  Rio Branco.

Saímos do Palácio com a certeza de que  precisamos visitar os museus em nossa cidade. Um povo que não conhece a sua cultura e história é considerada analfabeto cultural. Portanto, não desenvolve o interesse para compreender a História, assim afirma Gilberto Cotrim: “A História mostra o que os homens foram e fizeram. Isso nos ajuda a decidir o que podemos ser e fazer”. E o Palácio Rio Branco é o retrato do que foi e continua sendo a nossa História.



 

Agradecemos a todos que participaram da nossa conversa afinada em 20/04/2013.
 
   



 

          



      



































































































   



   
*Caso prefira, as visitas podem ser previamente agendadas através do telefone (71) 3117-6491.
Referências:
Silva, Cecília Luz, A Cidade do Salvador nos seus 454 anos. Salvador, EGBA, 2006.